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Fernando Pessoa escreveu: "As coisas passam, e o melhor que fazemos é deixar que elas possam ir embora. Deixar ir embora. Desprender-se.". Mas deixar ir é talvez um dos processos mais difíceis para o ser humano.

No geral, a vida possui um ciclo, ma série de etapas pela qual passa. A vida cria-se, é gerada. A vida desenvolve-se e cresce. A vida amadurece. A vida entra em declínio. A vida extingue-se. 

O ciclo da vida inclui o Homem, com todas estas fases e todas os diferentes movimentos cognitivos, emocionais e comportamentais. E, embora seja explicito o fim físico (não é a minha intenção entrar em conflito com outras visões e crenças, respeito todas as posições e daí restrinjo à questão física), a uma parte de diferentes culturas ainda tem dificuldades em abordar esta temática, quase como sendo um tábu. 

Por outro lado, ao longo da nossa vida, nós vamos sempre sofrendo perdas. O final de algo. Quer seja experiências que terminam, relações que acabam, intimidade de que se perde ou até mesmo bens que nos deixam de pertencer. A perda, no seu conceito mais geral, é algo que nos vai acompanhando. 

Mas se isso é tão natural, porque nos custa? Bom, podemos colocar algumas hipóteses:

Cultura - Ao contrário de outros países e cultura, os Portugueses não têm uma tradição de lidarem bem com a perda. Temos o Fado e a expressão sentimental que não tem tradução, Saudade. Por norma, somos uma povo saudosista, com esperança que o futuro nos traga as conquistas que outrora já tivemos. 

Educação - Desde o nosso nascimento, existe um grande problema em explicar a perda. É como se fosse um aspecto que evitamos, na esperança de não nos bater à porta. Podemos observar nas crianças e jovens, percebendo a forma como os pais possam ter tentado explicar o tema e, embora o façam com as melhores intenções, muitas das vezes criam a possibilidades de fantasias, na mente de crianças e jovens.

Religião - Portugal é um país religioso. Neste momento, as tradições religiosas são mais abrangentes, havendo uma maior liberdade de escolha sobre a doutrina religiosa com que a pessoa se possa sentir mais confortável e que lhe ofereça um sentido para a sua vida. Apesar desta escolha, a maior parte das religiões olham para a perda como um respeito, lembrança e saúde pelo ente, ao contrário de outras tradições que celebram a vida e utilizam este momento como um ritual de passagem. 

Deixarmos um caminho, quer seja por escolha ou imposição, mexe connosco. Muitas das vezes, esse processo é tão complicado que a pessoa estagna, enormes barreiras surgem na sua vida e aspectos sociais, profissionais, familiares, físicos e psicológicos podem ser afectados. Nesta altura, dizemos que o luto da perda não está a ser bem realizada. 

A pessoa perde a ligação que detinha com o "objecto de perda", o seu pensamento e emoções ficam comprometidas. Emoções como a tristeza e raiva surgem, assim como os sentimentos de perda, revolta, culpabilização ou alivio. Quando se lida bem com eles e conseguimos seguir o nosso percurso, então a perda é resolvida e conseguimos olhar e movimentar-nos para o futuro. Mas quando esta não é bem conseguida, os pensamentos, as emoções e os sentimentos são tão fortes que ficamos agarrados ao passado, sem conseguimos avançar para o futuro. Perdemos o nosso caminho.

Apoio familiar e social é fundamental, nestes momentos. E podem não ser suficientes. Nesse caso, cabe a esse sistema de apoio levar a pessoa a um profissional, de modo a conseguir poder ser ajudado. É importante referir que é um processo, não um momento. Não se ajuda uma perda num momento, mas sim ao longo do tempo. 

É importante, pois existe muita oferta que promete duas coisas: rapidez e esquecimento. Deixe que lhe diga, isso é uma completa estupidez! Sobre o primeiro ponto, volto a referir, estamos a falar de um processo e não em algo momentâneo. É necessário tempo para lidar com a perda. Em relação à memória, esses momentos não se conseguem esquecer, nem devem ser esquecidos! Fazem parte de nós e da nossa vida. Devem ser sim lidados, atribuir o seu significado, perceber que existem mais soluções e focos e deixar essas memórias repousar onde merecem estar, no passado. 

 


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