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Lanço-lhe um desafio… Quantas vezes é que você consegue ouvir-se a si próprio? Dá-se conta dos pensamentos que lhe passam pela mente? Ou talvez tenha consciência das sensações do seu corpo, à medida que foca a sua atenção? Ou talvez seja tão difícil para si já que a sua mente, o seu corpo e a sua atenção estão cheios de ruido? E não será isso que a atual sociedade pretende?

A partir do momento em que acordamos até ao momento que nos deitamos, tudo aquilo que constitui o ser humano encontra-se em constante movimento. Acelerado, diga-se de passagem! Acorda cedo e ainda cansado para o trabalho. Acelera todo o seu ritual matinal para evitar chegar atrasado. Se tiver filhos, começa a guerra diária para fazer com que eles se despachem para que possa deixá-los na escola, a tempo de ninguém se atrasar. O ritmo é tão acelerado que pode até nem ter tempo suficiente para tomar um pequeno-almoço em condições. Se tiver sorte, consegue evitar o trânsito ou a enchente nos transportes públicos, o que existe grandes dúvidas. Chega ao trabalho e já tem uma centena de tarefas para cumprir. Quando se dá por si, já está na sua hora de almoço e começa tudo um processo de comer o mais rápido possível para ainda tentar aproveitar um pouco da hora de almoço. Começa então a segunda ronda de centena de tarefas a cumprir e você só pensa nos minutos para a hora de saída. Inicia então o ritual de volta a casa ou ir buscar os filhos à escola. Depois disso, pouco tempo tem até preparar tudo para o jantar ou, só pelo divertimento, comprar jantar! Quando finalmente começa a ter tempo para descansar, começa a perceber que é melhor ir deitar-se e repousar, para acordar cedo de manhã. E assim o ciclo volta ao seu início.

É-lhe familiar? Imagino que sim, é a nossa vida atual!

A dificuldade na gestão do tempo e a exigência da sociedade faz com que estejamos sempre tão ocupados que não nos damos conta do que pensamos. E muitas vezes, quando nos damos conta, é sempre os pensamentos que geram mais stress e exigência.

Como tal, a nossa mente está sempre ocupada e o nosso foco de atenção está sempre difuso. 

Por outro lado, o marketing de programas de Mindfulness bombardeiam-nos com a ideia de focar a nossa atenção no momento, como sendo a solução quase mágica para uma mudança e melhoria nas condições de vida. Só que existe um problema: a filosofia oriental do Mindfulness é ligeiramente incompatível com o ritmo da sociedade ocidental! Isso faz com que muitas práticas não sejam totalmente eficazes, isto é, pelo menos sem o devido acompanhamento!

De modo a que nos foquemos no momento presente, com a nossa atenção plena, devemos considerar o movimento de aceitação dos nossos pensamentos, sem critica, sem julgamento, com curiosidade e compaixão por nós próprios. Não é que eles desapareçam, simplesmente não os vamos incomodar para que eles não nos incomodem. Quando isso acontece, instala-se uma sensação de silêncio na nossa mente.

E agora vai dizer-me assim: Isso é algo bom, não é? É o que se pretende para uma vida saudável! Bom, sim e não.

Efetivamente, o reconhecimento e identificação dos nossos pensamentos e emoções é um passo muito importante para alinharmos a nossa saúde mental e também física. Nesse sentido, podermos ter um momento de silêncio para prestarmos atenção a nós próprios é um passo muito importante. Todavia, quando nos escutamos a nós próprios, escutamos todas as nossas partes. Não só aquelas que são as nossas qualidades e competências, como também as partes mais "obscuras" da nossa mente, aquelas que gostamos de evitar para não ter de lidar.

Surge então um dilema existencial. O que fazer perante esta encruzilhada? Lidamos com o silêncio e tudo o que nos pode trazer ou simplesmente encontramos formas de criar ruido mental, de modo a evitar determinadas partes de nós?

Não posso dar uma resposta clara. Penso que cabe a cada um de nós, em plena consciência, perceber o que faz para mudar ou alimentar este dilema. Posso dizer por experiência clínica que este é um ponto central no processo de Psicoterapia e que muitas pessoas decidem não fazer o processo porque não se sentem preparadas, ou simplesmente escolhem não lidar com essas partes. 

E claro, depois de escutar, decidir o que fazer com isso!

E você, o quanto já se escutou hoje? Ou o quanto é que preencheu o seu ser para evitar as partes menos agradáveis de si, sussurrarem-lhe ao ouvido?


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